Raio X do Brasil: a arte de Steve Miller.

 

Renomado artista plástico de Nova York, Steve Miller é pioneiro em usar o computador na arte. Curioso em desvendar o funcionamento de tudo, encontrou na máquina de raio X uma nova linguagem artística: desde 1993 utiliza fotografia e lâminas de raio X em seus trabalhos. Miller customiza e sobrepõe imagens, gerando um resultado abstrato. Seu trabalho mais recente se chama Saúde do Planeta e envolve a Floresta Amazônica na criação de estampas que serão utilizadas pela marca brasileira Osklen na coleção de 2013. Em Nova York, Steve Miller conversou com Miriam Spritzer*:

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O artista norte-americano Steve Miller

 

Em um português quase tão brasileiro quanto o meu, Miller diz que queria fazer umcheck up na Amazônia. A ideia era mostrar para o mundo as diferentes espécies de animais e plantas da região, de uma forma mais artística e inusitada – daí o uso do raio X. As impressões ficaram tão interessantes que não demorou para que a Osklen quisesse agregá-las à sua coleção.

Como você foi parar no Brasil? 

Fui pela primeira vez ao Brasil em 2005, junto a outros artistas, a convite de Nessia Leonzini (Pope). Curadora brasileira residente em NY, ela estava montando uma feira de arte acessível – e eu contribuí com uma peça que era o raio X de um pé chutando uma bola de futebol. Nesta viagem fui ao Rio, São Paulo e Salvador. Tive vontade de ficar mais tempo no país, mas teria que ter alguma ideia para trabalhar no Brasil. Foi então que na Ilha Grande eu me deparei com a fruta jacá. Fiquei impressionado! Nunca tinha visto algo assim antes. Fiquei pensando no que haveria dentro dela e pensei que seria legal fazer um raio X dessa fruta. Decidi que se a Amazônia é o pulmão do mundo, como muitos dizem, faria um check up médico no Brasil com um raio X no seu pulmão.

Conte um pouco dos bastidores do seu trabalho no Brasil. 

O projeto teve duas fases. Comecei em São Paulo, fazendo as imagens das plantas. Depois segui para o Pará, para realizar o trabalho com os animais. Tive muita ajuda de artistas locais e das pessoas que trabalhavam nos hospitais, produzindo as imagens. Geralmente começávamos às 6h da tarde e terminávamos os raios X de madrugada. Além disso, fizemos remote sensing image, uma imagem de satélite – da Bacia Amazônia, por exemplo.

Houve algum choque em relação à cultura brasileira?

Com certeza! Nós vimos exatamente o que é o Brasil. Em São Paulo as coisas foram rápidas, mas demorou três anos para que eu conseguisse toda a estrutura em Belém do Pará, onde eu precisava de uma estrutura maior – um zoológico e um hospital. O radiologista Otávio Lobo foi de extrema importância para a execução do projeto e ficou responsável pelo melhor centro de radiologia que já conheci. Também contei com a ajuda de um aluno meu, o brasileiro Fabrício Branda. Mas foi muito complicado de fazer tudo acontecer, tanto pelas diferenças culturais quanto pelo idioma. Dois exemplos: na primeira vez que marquei com o diretor do zoológico ele não apareceu na hora marcada (com o tempo aprendi que isso faz um pouco de parte da cultura brasileira). E, por outro lado, apesar de Otávio ter apenas marcado um encontro no hotel, fez conosco um verdadeiro tour pela cidade, nos levou para jantar, apresentou pessoas. Enfim, foi a definição de hospitalidade brasileira.

 Como você escolheu do que tiraria raio X?

Além dos animais típicos da Amazônia – jacaré, piranhas, bicho-preguiça e tamanduá –, escolhia tudo que eu achava interessante ou curioso, ou que poderia criar uma boa imagem. A jaca acabou ficando muito parecida com o pulmão humano, por exemplo. No mercado público de Belém, compramos os mais variados tipos de peixes. E no zoológico tive a ajuda do veterinário para selecionar os animais e também planejar como levá-los.

O que mais impressionou durante este trabalho no Brasil?

O tamanho do mercado das flores em São Paulo. É gigantesco! Além disso, a quantidade de espécies diferentes tanto lá quanto no zoológico de Belém. Fizemos um passeio de barco pelo Rio Amazonas, e aquela sensação de estar dentro da floresta é inexplicável. Admito também que queria muito levar um tamanduá para a casa, são muito bonitinhos, mas claro que não poderia. No aspecto negativo, fiquei muito surpreso com a falta de estrutura de alguns lugares: o zoológico de Belém não tinha nenhum tipo de documentação sobre os animais, muito menos aparelhos de raio X para a saúde deles.

Como surgiu a parceria com a Osklen? 

Eu já conhecia a Osklen, sempre comprava alguma peça quando ia para o Brasil. Quando tive a ideia do projeto achei que seria interessante ter essas imagens em camisetas e bermudas, ainda mais porque a empresa tem a abordagem de ser socialmente responsável. Por casualidade encontrei com Oskar Metsavaht em um baile de gala do Brazil Foundation e fomos apresentados, ainda que eu não soubesse que ele era o estilista da marca. Conversamos e ele me contou que havia ido recentemente a Belém em busca de tecidos para as roupas. Foi aí que descobri que ele era o Oskar da Osklen! Então eu disse: “Tenho uma ótima ideia para você!”. E foi assim que a parceria aconteceu.

* Miriam Spritzer é coach de profissão, tem formação em administração e marketing e ainda transita pelo mundo do teatro musical. Mora em NY e está sempre atenta aos mais variados shows e exposições. É também correspondente internacional no programa Tudomais da TVCOM.

Debora Tessler